Como assim? Professores não deveriam viver felizes? Afinal, os governantes facilitam em muito o nosso trabalho e os alunos estudam com vontade... Bem, chega de ironia! Qualquer ser com QI de ameba de plástico sabe que é justamente o contrário! E, sinceramente, eu não vejo luz no fim do túnel! Pelo menos enquanto a educação continuar sendo encarada por nossos governantes como um gasto e não como um investimento...
O Governo do Estado do Rio de Janeiro entrou numa de "salvar a educação pública" com o que resolveu chamar de "choque de ordem na educação". Choque de ordem? Como assim? Resolvi publicar aqui um artigo escrito pelo colega Adolpho Ferreira, Professor de História da rede municipal do Rio de Janeiro e publicado originalmente no blog "Sindicalismo Militante" (http://sindicalismomilitante.blogspot.com/). O Sindicalismo Militante é um movimento de oposição de esquerda organizado por professores e funcionários da rede estadual e das redes municipais que atuam no SEPE-RJ.
Vamos ao artigo:
Choque de ordem (qual ordem?) ou mera propaganda do governo estadual?
O jornal O Globo de 8 de janeiro de 2011 apresentava como principal manchete "Estado anuncia choque de ordem na educação", na dianteira da propaganda das medidas recentes do governo do estado para a Educação. Os professores precisam manifestar-se publicamente diante dessas medidas em todos os seus meios, já que a versão oficial do governo do estado é veiculada amplamente pela mídia que o apóia.
A primeira medida listada pelo jornal na primeira página é o processo seletivo elaborado pelo próprio governo estadual para a escolha de diretores de escolas. Esta medida avança na contramão daquilo que é apontado por todas as correntes pedagógicas como a forma que mais contribui para o ensino-aprendizagem de excelência: a escolha democrática dos gestores realizada pelos professores, funcionários e comunidade escolar.
A segunda medida relacionada é a contratação de uma empresa "para rever as licenças médicas dos oito mil professores afastados"(1). Então, contrata-se uma empresa privada com dinheiro público para realizar algo que a perícia estadual deveria realizar. Isto, sim, representa gasto público, e não investimento. Além disso, o jornal não problematiza a questão como deveria, já que os jornalistas deste meio sabem perfeitamente o imenso número de notícias que revelam as condições de trabalho dos professores da rede pública estadual. Professores e funcionários trabalham, boa parte das vezes, em situações de alto nível de violência, com medo(2), convivem com situações de assédio moral, além da desvalorização profissional e salarial, problemas que acabam gerando um enorme número de doenças nos profissionais de educação, especialmente doenças psiquiátricas. Isto faz com que os professores sejam a segunda categoria dos funcionários públicos estaduais que mais precisam de licença do trabalho, somente abaixo dos policiais.
Em terceiro lugar, informam que o "projeto de redução de gastos vai resultar numa economia de R$ 111 milhões só este ano"(3). E aonde vai parar tanto dinheiro? Vai parar, por exemplo, no bolso do governador e dos deputados estaduais, que receberam um generoso aumento salarial há poucos dias. Assim tratam a educação pública: um gasto, um peso que precisa ser aliviado. É assim que se faz educação de qualidade? Não é preciso nem ser advinho para saber que a educação pública estadual só ficará entre as cinco melhores do país com melhorias de fato e não com mera propaganda do governo - a não ser que haja brutal distorção dos dados do IDEB, coisa que não pode ser descartada, já que o PT, comandante do Ministério da Educação que gerencia o IDEB, é o principal aliado do governo estadual de Cabral/PMDB.
Ainda informam que "o próximo passo poderá ser a mudança no fornecimento de merenda: há um estudo em andamento para centralizar a compra em vez de cada escola adquirir os alimentos"(4). Esta medida, portanto, acabaria com a autonomia das escolas para gerir a alimentação dos alunos, impedindo a análise das necessidades específicas de cada comunidade escolar. Caso esta medida seja concretizada, certamente veremos uma única empresa monopolista do setor realizando a venda para todas as escolas, experiência que ocorre com muitos problemas graves na rede municipal pública do Rio de Janeiro(5). O dever do estado é resolver os problemas e irregularidades que aconteçam, não retirar a autonomia das escolas.
Para o governo estadual e a mídia dos grandes jornais, revistas e TVs é isso mesmo: professor tem que ganhar pouco, educação pública representa gastos e negócios. Tem que dar dinheiro, não formar seres humanos críticos(6). Assim não se faz educação de qualidade, assim não se tira a educação pública do buraco em que está. Precisamos de professores e funcionários bem remunerados, com vencimentos básicos decentes, com tempo para aprofundar sua formação permanentemente, boas condições de trabalho nas escolas, autonomia das escolas e dos profissionais de educação, gestão democrática das escolas e investimento público, mas um grande investimento público, porque educação pública de qualidade não é barata. Algo é certo: qualquer centavo investido na educação provocará melhorias sociais incomparáveis aos milhões/bilhões investidos nos bolsos do governador e dos deputados estaduais - o que, infelizmente, aplica-se à imensa maioria de vereadores, deputados, senadores e chefes do executivo.
Para o governo estadual e a mídia dos grandes jornais, revistas e TVs é isso mesmo: professor tem que ganhar pouco, educação pública representa gastos e negócios. Tem que dar dinheiro, não formar seres humanos críticos(6). Assim não se faz educação de qualidade, assim não se tira a educação pública do buraco em que está. Precisamos de professores e funcionários bem remunerados, com vencimentos básicos decentes, com tempo para aprofundar sua formação permanentemente, boas condições de trabalho nas escolas, autonomia das escolas e dos profissionais de educação, gestão democrática das escolas e investimento público, mas um grande investimento público, porque educação pública de qualidade não é barata. Algo é certo: qualquer centavo investido na educação provocará melhorias sociais incomparáveis aos milhões/bilhões investidos nos bolsos do governador e dos deputados estaduais - o que, infelizmente, aplica-se à imensa maioria de vereadores, deputados, senadores e chefes do executivo.
Adolpho Ferreira
Professor de História da rede municipal do Rio de Janeiro
Notas:
(1) O Globo, 8 de janeiro de 2011, p.1, "Estado anuncia choque de ordem na educação".
(2) JC Online, 7 de janeiro de 2011, "Professor é agredido por aluno descontente com nota", acessado em 8/01/2011 http://jc.uol.com.br/canal/
(3) O Globo, idem.
(4) Idem, idem.
e Terra Notícias, 25 de maio de 2009, "Fornecedora de merenda escolar recebeu 108 advertências no Rio", acessado em 8/01/2011 http://noticias.terra.com.br/
(6) O Globo Online, 6 de outubro de 2010, "'Penso em educação como um negócio', diz novo secretário estadual de Educação ao assumir o cargo", acessado em 8/01/2011 http://oglobo.globo.com/rio/
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